sexta-feira, 10 de abril de 2009

Por uma nova lei de Cultura e um revisionismo justo de nossa história



continuando uma das funções deste blog - ajudar na divulgação das notícias, aquelas que a grande mídia não quer - transcrevo abaixo dois artigos, uma da Agência Brasil de Fato e a outra da revista Caros Amigos. ditadura e cultura, outra vez.

Trabalhadores da cultura ocupam Funarte
por jpereira última modificação 31/03/2009 14:35

Articulados em torno do Movimento 27 de Março, grupos pedem o fim da isenção fiscal como mecanismo de promoção cultural e a criação de um fundo público para a área, com orçamento anual definido em lei

27/03/09
Juliano Domingues de São Paulo (SP)

Cerca de 300 trabalhadores da cultura ocuparam, nesta sexta-feira (27), a sede da Fundação Nacional das Artes (Funarte), na cidade de São Paulo. O ato foi organizado pelo Movimento 27 de Março, que reúne os grupos Redemoinho, Teatro de Rua de SP e Roda de Fomento. Os manifestantes exigem mudanças nos mecanismos que hoje regulam o fomento à cultura e que são, em sua maioria, regulados pela Lei Rouanet.

A legislação proporciona isenção fiscal para as empresas que investirem em áreas ligadas às artes plásticas, teatro, dança ou música. Segundo Roberta, uma trabalhadora que não quis se identificar, isso gera uma lógica mercadológica para o incentivo à cultura, pois só recebem dinheiro os projetos que dão lucro para as empresas.

“O nosso produto [teatro, artes plásticas, dança e música] é encarado como mercadoria, e esse não é o seu propósito. A nossa intenção é que essa cultura chegue a todos, que haja um acesso democrático a ela. No entanto, as propostas do governo caminham para a privatização da cultura. Ou seja, estamos com nossos editais atrelados às verbas de empresas privadas”, critica.

Os trabalhadores reivindicam o fim do mecanismo de isenção fiscal da Lei Rouanet, a criação de um fundo público de financiamento para a cultura e que a área tenha um orçamento mínimo anual definido por lei. Além disso, querem o descongelamento dos 75% do Orçamento da União para o Ministério da Cultura.

Uma representante do Ministério deverá ir ao local, ainda nesta sexta-feira, para ouvir as propostas dos trabalhadores. (Radioagência NP)
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Confira abaixo o documento divulgado pelos manifestantes durante a ocupação

CARTA ABERTA AO MINISTÉRIO DA CULTURA

Hoje, no Dia Mundial do Teatro, nós, trabalhadores de grupos teatrais de São Paulo organizados no Movimento 27 de Março, somos obrigados a ocupar as dependências da Funarte na cidade. A atitude extrema é provocada pelo falso diálogo proposto pelo governo federal, que teima em nos usar num debate de mão única. Cobramos, ao contrário, o diálogo honesto e democrático que nos tem sido negado.

O governo impõe um único programa: a transferência de recursos públicos para o marketing privado, o que não contempla a cultura mas grandes empresas que não fazem cultura. E se recusa, sistematicamente, a discutir qualquer outra alternativa.

Trocando em miúdos.
O Profic – Programa de Fomento e Incentivo à Cultura, que Vv. Ss. apresentam para discussão como substituto ao Pronac, que já existe, sustenta-se sobre a mesma coisa: Fundo Nacional de Cultura – FNC, patrocínios privados com dinheiro público (o tal incentivo/renúncia fiscal que todos conhecem como Lei Rouanet) e Ficart – Fundo de Investimento Cultural e Artístico.
Ora, o Fundo não é um programa, é um instrumento contábil para a ação dos governos. Já o Ficart (um fundo de aplicação financeira) e o incentivo fiscal destinam-se ao mercado, não à cultura. O escândalo maior está na manutenção da renúncia/incentivo fiscal, a chamada Lei Rouanet, que o governo, empresas e mídia teimam em defender e manter.

O que é a renúncia ou incentivo fiscal? É Imposto de Renda, dinheiro público que o governo entrega aos gerentes de marketing das grandes empresas. Destina-se ao marketing das mesmas e não à cultura. É o discurso que atrela a cultura ao mercado que permite esse desvio absurdo: o dinheiro público vai para o negócio privado que não produz cultura e o governo transfere suas funções para o gerente da grande corporação. Diminuir a porcentagem dessa transferência ou criar normas pretensamente moralizadoras não muda a natureza do roubo e da omissão do governante no exercício de suas obrigações constitucionais. Não se trata de maquiar a Lei Rouanet (incentivo fiscal); trata-se de acabar com ela em nome da cultura, do direito e do interesse público, garantindo-se que o mesmo dinheiro seja aplicado diretamente na cultura de forma pública e democrática.

Assim, dentro do Profic, apenas a renúncia fiscal pode se apresentar como programa, um programa de transferência de recursos públicos para o marketing privado, em nome do incentivo ao mercado. Trata-se, portanto, de um programa único que não vê e não permite outra saída, daí ser totalitário, autoritário, anti-democrático na sua essência.

E é o mesmo e velho programa que teima em mercantilizar, em transformar em mercadoria todas as atividades humanas, inclusive a cultura, a saúde e a educação, por exemplo. Não é por acaso que os mesmos gestores do capital ocupam os lugares chaves na máquina estatal da União, dos Estados e Municípios, coisas que conhecemos bem de perto em nosso Estado e capital, seus pretensos opositores.

E esse discurso único não se impõe apenas à política cultural. É ele que confunde uma política para a agricultura com dinheiro para o agronegócio; que centra a política urbana na construção habitacional a cargo das grandes construtoras; e outra coisa não fazem os gestores do Banco Central que não seja garantir o lucro dos bancos. Não há saída, não há outra alternativa, os senhores continuam dizendo, mesmo com o mercado falido, com a crise do capital obrigando-os a raspar o Tesouro Público no mundo todo para salvar a tal competência mercantil.

Pois bem, senhores, apesar do mercado, nós existimos. Somos nós que fazemos teatro, mas estamos condenados: não queremos e não podemos fabricar lucros. Não é essa a nossa função, não é esse o papel do teatro ou da cultura. Nós produzimos linguagens, alimentamos o imaginário e sonhos do que muitos chamam de povo ou nação; nós trabalhamos com o humano e a construção da humanidade. E isso não cabe em seu estreito mundo mercantil, em sua Lei Rouanet e seu programa único.

Nós somos a prova de que outro conceito de produtividade existe. Os senhores continuarão a tratar o Estado e a coisa pública apenas como assuntos privados e mercantis? Continuarão a negar nosso trabalho e existência? Continuarão a negar a arte ou a cultura que não se resumem a produtos de consumo?

Por isso, além do FNC, exigimos uma política pública para a cultura que contemple vários programas (e não um único discurso mercantil), com recursos orçamentários e regras democráticas, estabelecidos em lei como política de Estado para que todos os governos cumpram seu papel de Poder Executivo.

É esse diálogo que os senhores se negam, sistematicamente, a fazer enquanto se dizem abertos ao debate. Debate do quê? Do incentivo fiscal. Mas nos recusamos a compartilhar qualquer discussão para maquiar a fraude chamada Lei Rouanet.

Queremos discutir o Fundo. Mas queremos, também, discutir outros programas e oferecemos, novamente, o projeto de criação do Prêmio Teatro Brasileiro como um ponto de partida. Os senhores estão abertos a esse diálogo?

Movimento 27 de Março

São Paulo, Dia Mundial do Teatro e do Circo

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DURA QUE FOI DITA, BRANDA

Por Thaís

O editorial “Limites a Chávez”, do jornal Folha de S. Paulo, no dia 17 de fevereiro gerou uma série de críticas. Feito um resgate infeliz das palavras do militar chileno Augusto Pinochet, o texto usou o termo “ditabranda” para se referir ao regime militar brasileiro.
Desde a publicação, o jornal recebeu dezenas de cartas sobre o assunto, foi alvo de críticas em blogs e comunidades do Orkut e, ainda, o editorial foi assunto de uma entrevista da socióloga Maria Victória Benevides à revista Carta Capital। Na matéria ela questiona a posição do jornal pelo uso do termo e crítica o tratamento da Folha com os que se manifestaram contra a expressão.

A nota da redação do jornal em reposta a uma das cartas, publicada no dia 20 de fevereiro, serviu para aumentar ainda mais a tensão। Abaixo do texto do professor Fábio Konder Comparato que dizia que o autor e diretor do jornal “deveriam ser condenados a ficar de joelhos em praça pública e pedir perdão ao povo”, a nota julgava como cínica e mentirosa a indignação do professor e da socióloga Maria Victória Benevides.

Em entrevista, Comparato diz que considera a defesa do termo “ditabranda” pelo jornal um “tiro no pé”. “Uma história que os Frias queriam manter guardada, agora veio à tona”, explica. A afirmação se refere à suposta ligação do jornal com o regime militar e colaboração com veículos para o transporte dos presos políticos. Ele lembra do editorial publicado em 1971, que declarava apoio do jornal à ditadura:
“... um governo sério, responsável, respeitável e com indiscutível apoio popular, está levando o Brasil pelos seguros caminhos do desenvolvimento com justiça social - realidade que nenhum brasileiro lúcido pode negar, ...”, publicado dia 22 de setembro de 1971।

Comparato era assinante há 40 anos da Folha de S। Paulo, “Agora não assino mais nada”, conta a decisão tomada após ser insultado pelo jornal. Esse episódio ainda gerou um manifesto de repúdio à maneira como a Folha se refere à Maria Victória Benevides e Fábio Konder Comparato, assinado, até então, por sete mil pessoas.

Dias depois, a Folha publicou uma coluna do Fernando de Barros e Silva e uma do Marcos Nobre recriminando o editorial. Ao ser questionado sobre a intenção de amenizar as críticas com as duas publicações, o Ombudsman da Folha Carlos Eduardo Lins da Silva diz que não pode responder pelo jornal, nem sobre suas intenções. “Eu não trabalho na redação e meus contatos com ela são mínimos”, explica.

Em relação ao termo “ditabranda”, “Como eu ocupo a posição de Ombudsman, não posso me pronunciar publicamente”, afirma Carlos Eduardo Lins, mas confessa que a resposta da redação a dois leitores foi inconveniente।

Em protesto à falta de espaço que a mídia ofereceu para o assunto, Eduardo Guimarães, presidente do Movimento dos Sem Mídia, propôs uma manifestação em frente ao prédio da Folha, no sábado, 7 de março। “Até agora a voz que tem permanecido é dos defensores da ditadura, os ex-presos que sabem o que aconteceu não tem chance nos jornais, por isso vamos lá na porta falar por eles”, declara o presidente।

movimento surgiu em outubro de 2007। Segundo Eduardo, ele criou o Movimento dos Sem Mídia, pois sente que falta a voz da população na grande imprensa. “Como os sem terra, somos os sem mídia”, explica.Criador, também, do blog Cidadania, apesar de ser representante comercial, Eduardo considera seu trabalho na comunicação uma obrigação com a sociedade. E foi lá que ele sugeriu a idéia da manifestação, que logo ganhou adeptos. “Dizer que a ditadura foi branda é um crime”, afirma.
Manifestação

A manifestação de 7 de março reuniu aproximadamente 300 pessoas em frente ao prédio do jornal Folha de S। Paulo. Estavam presentes ex-presos políticos, sindicatos, membros da Universidade de São Paulo (USP) e da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), e pessoas indignadas com a atitude da Folha.

Os banners com fotos dos assassinados pelo regime militar e placas reivindicando o pedido de desculpas da Folha chocavam os passantes do local। A manifestação foi marcada por relatos cheios de emoção.

Ivan Seixas, ex-preso político, declarou que a Folha de S। Paulo colocou todo o seu jornal à disposição do DOI-CODI, “A Folha de S. Paulo ofereceu carros para transportar os presos”. Ele ainda afirmou que o Otavio Frias Filho quer trazer de volta a ditadura, porém, desta vez, com a Folha de S. Paulo no controle.

“Para nós que tivemos nossas companheiras estupradas, nossos amigos assassinados, dizer que foi uma ‘ditabranda’ é inaceitável”, protesta।O representante da Intersindical dos Trabalhadores, Toshio Kawamura, fez um homenagem a todos os seus amigos que morreram por conta do regime militar. Ao chamar o nome dos seus companheiros, Toshio se emocionou e convidou outros presentes a clamar por seus amigos assassinados.

Em entrevista, Alípio Freire, também ex-preso político, disse que a manifestação é importante, principalmente, para os mais jovens, pois como eles não viveram naquela época, os depoimentos das pessoas presentes dão outro olhar sobre o que foi a ditadura no Brasil।

No domingo, (08/03), a Folha publicou que foi um erro utilizar o termo “ditabranda” para se referir à ditadura brasileira: “O termo tem uma conotação leviana que não se presta à gravidade do assunto”। O texto, escrito por Otavio Frias Filho, assume que a resposta aos professores Fábio Comparato e Maria Victória Benevides foi ríspida, porém, motivada pela insinuação de que os responsáveis pelo editorial deveriam se ajoelhar e pedir perdão em praça pública.

A expressão equivocada do editorial serviu para demonstrar que as atrocidades praticadas pela ditadura ainda estão vivas na memória de muita gente, inclusive o papel da Folha de S. Paulo naquele período.
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Thaís Sabino é estudante de Jornalismo।

NOTA DA REDAÇÃO: A próxima edição da revista Caros Amigos, que deve chegar às bancas até o dia 10 de abril, terá uma reportagem ampla sobre o episódio da “Ditabranda”. Não deixe de ler.